sexta-feira, 31 de maio de 2024

A mística da Matriz de Quixeramobim

 
Arquivo Quixeramobim Histórico

O que me chama mais a atenção na Igreja Matriz de Quixeramobim é a sua cor. O conterrâneo doutor Antônio Monteiro de Moraes Nascimento disse certa vez, em artigo publicado no século passado no jornal O Povo, que ela tem uma “brancura mística”. Não discordo, do contrário, como explicar o arrepio que sinto toda vez que retorno à minha cidade e a contemplo? Sob o sol forte do sertão cearense, a igreja reflete um brilho majestoso indecifrável para mim.
 
Da alegria causada pelo encantamento ao vê-la, logo surge a tristeza de uma constatação ao olhar em volta. Por anos a modernidade tenta apagar o seu protagonismo. Muitos dos antigos casarões, que estiveram presentes ao seu lado durante tantos fatos importantes na cidade, já não existem mais, destruídos pelo progresso. Agora no seu entorno restam poucos daqueles velhos amigos. Fracos e pálidos, eles resistem bravamente. Novos prédios, quadrados e sem graça, surgem tentando sufocá-la. O mais recente e ousado foi um jovem herege chamado “casa de shows”, que teve a audácia de se colocar ao seu lado gritando com suas barulhentas caixas de sons. Que falta de respeito com as velhas paredes branquinhas da Matriz.
 
Mas é com sua brancura imponente que ela sobrevive, desde 1780, para atingir o seu apogeu todos os anos nas festas do mês de junho. O dia do seu padroeiro Santo Antônio é o treze, mas já em maio se inicia a sua preparação para as festividades, com os ritos religiosos da paróquia movimentando os fiéis, e os prazeres do parque de diversões alvoroçando crianças, jovens e adultos, todos fascinados. Fé e satisfação não competem, pelo contrário, unem-se numa perfeita simbiose de costumes interioranos. A cidade parece efervescer ao seu redor.
 
Arrumada por algumas mãos de cal, a altivez da Matriz orna-se com as luzes coloridas dos brinquedos do parque de diversões, que parecem maquiar toda a extensão do seu corpo. De frente para ela, a roda gigante respeitosamente pede licença às duas torres para só naquele período ultrapassá-la em altura. Num movimento de trezentos e sessenta graus, lentamente a grande roda se abaixa e depois se levanta, reverenciando-a com sua rotação.
 
No seu lado direito, a Igreja Matriz congrega os seus filhos, os que foram morar distante e os que ficaram. Arma-se ali no seu alpendre o grande barracão de Santo Antônio. Comida, bebida e fartura! No calor noturno da noite de leilão, irrompe uma confluência de apertos de mãos, abraços, e toda sorte de saudações entre parentes que moram longe e se reveem, velhos amigos de infância que só se encontram naquele dia, e conhecidos locais satisfeitos em recepcionar a todos.
 
Nessa noite é possível experimentar um sentimento que se mantém o mesmo, ano após ano. Uma alegria em poder estar presente ao lado de pessoas especiais, quixeramobinenses de todos os lugares, de todas as gerações, cada um festejando a sua fé, o seu pertencimento à terra e os seus costumes sertanejos. Talvez seja essa a mística que o doutor Antônio Monteiro relatou observar ao olhar para a Igreja Matriz.  

Por Eduardo Coutinho
Quixeramobim Histórico

Um comentário:

  1. De fato, nos inspiramos ao ver a centenária igreja de Quixeramobim. Símbolo maior de várias gerações. Um templo antigo que acolheu e acolhe os filhos da cidade e quem mais vier. Merece sempre o nosso respeito e nunca heresia. No seu chão sagrado todos podem chegar e rezar confiantemente. Tantos padres se dedicaram e executaram suas missões ali com muito amor e esperança. Velho e sempre lindo templo de todos que amam Jesus!

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